quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

Elogio a Tanja Nijmeijer



O compromisso com o mundo, não apenas com a pura "res" tangivel, ontica, das coisas - a "produzida" realidade nua e crua - mas com a imponderável instancia comum que nos atravessa, e que não se reduz à mera e impessoal vida biológica, é cada vez mais exíguo nos dias que correm. O fim deste compromisso mundano, que pode ser deduzido nas insígnias da despolitizacão e da opacidade das esferas públicas, tem como uma de suas causas mais óbvias e remotas a decadência do thymos como virtude humana privilegiada. Segundo Peter Sloterdijk, no mundo moderno - disseminada no mundo contemporâneo - ocorre uma plena deterioração dos gestos e emblemas timóticos pagãos para a ascensão das representações eróticas, inversão operada basicamente pela moderna psicologia - aí influenciada por todo um conjunto de categorias surgidas com o cristianismo: o campo timótico – e seus traços de coragem, orgulho, virtú mundana, auto-valorização, ira, foi suprimido como superbia ou, posteriormente, como sintoma neurótico (os mitos de Narciso e Édipo substituindo as imagens de Aquiles e Ulisses), demarcando-se o momento em que os terapeutas encontrar-se-ão remotamente associados aos moralistas cristãos.


Thymos, termo recorrente nos cantos da Ilíada, significa ali a coragem profana exigida aos herois para que deixem do conforto de suas casas privadas, sua família e até de sua pátria para se arriscar, colocando suas vidas em xeque, numa acão comum. Isso não significa que este gesto esteja de antemão respaldado racionalmente. Ao contrário, o thymos se dá justamente no salto em relação ao desconhecido, nunca se saberá em termos exatos se o gesto foi o mais adequado: a imanência da contingência humana é indecidível.


O momento do salto, da passagem ao ato, é um instante de loucura.


Admiro e bendigo pessoas como Tanja Nijmeijer que, nos tempos de paralisia existencial massificada, bovinamente satisfeita e supondo-se sem termo (a morte é o grande tabu do tempo presente), com a exceção de curtas Primaveras para as quais ainda se tenta impor o eclipse da nuvem de balas, arrisca sua jovem vida nas selvas colombianas: armada com uma metralhadora, livros e alguns precários e confusos ideais. Tanja se rebela não apenas contra o aparato de conquista militar orquestrado pelos combalidos EUA via plano Colômbia, mas luta contra a imagem da bela moça europeia cujo horizonte próximo seria apresentar-se como a Dulcinéia de algum executivo perfumado. Ela é o Dom Quixote mais belo que a terra já viu. Luta contra moinhos de vento que lançam bombas e cospem napalm. Sua vida se justifica em sua coragem, reencenando Homero no insosso e covarde sec. XXI.


Longa vida à sua ira, linda guerrilheira Tanja, onde estiveres, nas tricheiras ou tendas da selva, serás uma ágora. Heroína da luta perdida contra um porvir sonambúlico e conformado.

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