quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Pequeno delírio em parágrafo VII


Uma obsessão pelos recônditos lugares onde se inventam biografias. Não há propriamente uma voz capaz de dizer a vida. E o que dizer da letra morta, do deslizar da pena pela folha em branco? O livro da vida é escrito numa língua sonhada (e já lembrava o velho Giorgio: "Não é o sonho, sempre, uma dimensão não além das línguas, mas entre as línguas e que, como tal, precisa de uma interpretação e de uma Deutung?"), porém, sempre a partir de um relance obsceno entre a vigília e o sono. Incomodar-se até a morte com a própria obsessão; despertar e levantar tentando deitar as letras no seu leito branco que é a página. E, como Proust, deleitar-se, como se a sensação nessas estâncias obscenas fosse um frêmito interminável: "(...) assim, quando acordava no meio da noite, e como ignorasse onde me achava, no primeiro instante nem mesmo sabia quem era; tinha apenas, em sua singeleza primitiva, o sentimento da existência, tal como pode fremir do fundo de um animal; estava mais despercebido que o homem das cavernas."

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