segunda-feira, 10 de março de 2014

Moradas no mundo


Moradas
En la mano crispada de un muerto,
en la memoria de un loco,
en la tristeza de un niño,
en la mano que busca el vaso,
en el vaso inalcanzable,
en la sed de siempre.

A. Pizarnik.

De todas as formas de acordar, talvez a mais concreta - a mais dura e, ao mesmo tempo, incontrastável -, seja aquela em que nos damos conta de que o mundo inteiro parece transformado em pedra. Tudo ao redor, na queixosa ebriedade do recém desperto, ganha a opacidade do sem sentido, e tudo o mais não parece senão a persistência do trabalho de Sísifo em que a pedra é colocada como único horizonte, como único fim. Antes de dormir, lia um conto de Onetti que assim começava: "Em Santa María nada acontecia, era outono, a não ser a doçura brilhante de um sol moribundo, pontual, lentamente apagado. Para toda a gama de santa-marienses que olhavam para o céu e para a terra antes de aceitar o adequado nonsense do trabalho." A luz solar, o brilho doce que talvez pudesse guiar a noite de sonhos, é obliterado pelo peso da pedra, pela angustiante roda pétrea dos dias, cuja imagem mais impactante e perfeita talvez seja aquela da devoração dos filhos de Chronos. Mas agora, pela manhã, a luz do sol insiste em retomar o centro da cena. Por que, então, a dureza e peso concreto desse despertar que não vê senão o nonsense? Por que não aceitar, tal como os santa-marienses de Onetti, a adequação da vida nos eixos do sem sentido, na obrigação de empurrar a pedra do mundo para nada? A luz não rompe o silêncio da pedra, e tal silêncio é a concretude do despertar. Nada a não ser a fragilidade de alguém à beira do silêncio absoluto pode fazer da grande pedra, apenas uma pedra. E dessas tentativas, talvez uma, de alguém que sucumbiu ao peso do nonsense, possa ser a primeira forma de lapidar, com esses ligeiros golpes que são as palavras, essa pedra matinal.

Fragmentos para dominar el silencio

I

Las fuerzas del lenguaje son las damas solitarias, desoladas, que cantan a través de mi voz que escucho a los lejos. Y lejos, en la negra arena, yace una niña densa de múscia ancestral. Dónde la verdadera muerte? He querido iluminarme a la luz de mi falta de luz. Los ramos se mueren en la memoria. La yacente anida en mí con su máscara de loba. La que no pudo más e imploró llamas y ardimos.

II

Cuando a la casa del lenguaje se le vuelva el tejado y las palabras no guarecen, yo hablo.
Las damas de rojo se extraviaron dentro de sus máscaras aunque regresarán para sollozar entre flores.
No es muda la muerte. Escucho el canto de los enlutados sellar las hendiduras del silencio. Escucho tu dulcísimo llanto florecer mi silencio gris.

III

La muerte ha restituido al silencio su prestigio hechizante. Y yo no diré mi poema y yo he de decirlo. Aun si el poema (aquí, ahora) no tiene sentido, no tiene destino.

(Alejandra Pizarnik)


Imagem: Pieter Brueghel, o jovem. Provérbios (detalhe). Rockox House, Antuérpia.
       

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