terça-feira, 10 de julho de 2007

Irreparável


Um ser que não é nunca ele mesmo, mas é só o existente. Não é nunca existente, mas é o existente, integralmente e sem refúgio. Ele não funda, nem destina nem torna nulo o existente: é apenas o seu ser exposto, a sua auréola, o seu limite. O existente já não reenvia para o ser: ele é no meio do ser e o ser é inteiramente abandonado no existente. O existente já não reenvia para o próprio ser: ele é no meio do ser e o ser é inteiramente abandonado no existente. Sem refúgio e, todavia, salvo – salvo no seu ser irreparável. O ser, que é o existente, é para sempre salvo do risco de existir como coisa ou de ser nada. O existente, abandonado no meio do ser, é perfeitamente exposto. (...)


Apenas podemos ter esperança naquilo que é sem remédio. Que as coisas estejam assim ou de outra maneira – isto é ainda no mundo. Mas que isso seja irreparável, que o assim seja sem remédio, que nós possamos contempla-lo como tal – isto é a única passagem para fora do mundo. (O caráter mais íntimo da salvação: que sejamos salvos só no instante em que já não queremos sê-lo. Por isso, nesse instante, existe salvação – mas não para nós).



AGAMBEN, Giorgio. A comunidade que vem. pp. 81-83.

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