quinta-feira, 19 de dezembro de 2019

O estalinismo cirandeiro





Qué cosas lo aburren?
El discurso vacío de la izquierda. El discurso vacío de la derecha ya lo doy por sentado.
Da última entrevista de Roberto Bolaño (nuevamente)




                                                                                                                          jonnefer barbosa






Há uma nova tendência de moda que pretende se desprender dos trajes démodés do esquerdismo cirandeiro e apresentar-se como “radical”: são os estalinistas de rede social. Mas não há nada de radical no estalinismo. Stálin foi um oportunista criminoso. As guerras civis russas, que derrubaram as forças policiais czaristas, foram vencidas pelo exército vermelho formado, treinado e comandado por Liev Davidovich Bronstein, vulgo Trotsky. Stálin só se tornou líder supremo destas forças perseguindo Trotsky: prendendo-o, torturando-o, matando milhares de apoiadores e quase todos os  familiares, apagando-o da história oficial soviética para em seguida executá-lo no México, em 1940, com Ramón Mercator e uma picareta de gelo. Antes, em 1939, assinou um pacto de não agressão com os nazistas. O pacto Molotov-Ribbentrop só foi rompido, e Stálin se viu obrigado a combater seus antigos aliados, em virtude da Unternehmen Barbarossa: a tentativa de invasão dos nazistas à União Soviética em 1941. Quem defendeu os territórios russos e verdadeiramente venceu a guerra foram as pessoas comuns treinadas por um judeu que se tornou pária, perseguido e assassinado no mais desesperado exílio.



O estalinista cirandeiro esquece tudo isso e louva, em uma contraditória lamúria seguida por centenas de incautos, O Estado, O Partido, A Organização. Mas sem laivos “utópicos” ou derivas “anarquistas”: seu Estado é o mesmo da Polícia Militar – são “trabalhadores” – e seu partido é o que está aí: o estalinista cirandeiro filia-se aos partidos registrados e permitidos pelo TSE. Sua única “clandestinidade” é vender livros por editoras alternativas chiques da burguesia de esquerda paulistana. Sua organização é o Twitter®, o Facebook®, o Instagram®, o YouTube®. Louvam a violência, porém atirariam nos próprios pés se lhes dessem armas (ou seriam abatidos pelos milicianos treinados). O estalinista cirandeiro esquece que a revolução russa implicou a destruição das estruturas e do estado czarista, e que Stálin, seu protótipo de masculinidade, foi um retorno contrarrevolucionário ao czarismo sob assinatura burocrática, ressentida e sanguinária.



Os estalinistas de rede social são cirandeiros pois seu estalinismo, felizmente, é só de fachada. Um marketing, uma marca. Leve e vendável atentado ao pudor politicamente correto.  Como o sangue e a violência o são para Zé do Caixão ou Robie Zombie: máscaras e performances. Mesmo porque, se uma forma estalinista fosse instaurada politicamente, a facção cirandeira seria a primeira a ser exterminada. O antissemitismo arraigado e institucionalizado de Stálin foi também uma forma de racismo necropolítico, obviamente distinto do nazifascismo.



Há um revival estalinista na esquerda brasileira?  Não, apenas alguns jovens incautos fazendo pose de radicais e marketing pessoal nas redes. O objetivo último do estalinista cirandeiro não é a revolução, mas chocar a esquerda acadêmica acomodada com seus cargos (isso é ótimo!) e ganhar alguns seguidores nas redes sociais hoje dominadas por robôs e bolsominions neopentecostais. Luta inglória e perdida.



Os estalinistas serão sempre aqueles que tentarão restaurar e manter a polícia e o poder do Czar. Não o destruir. Os estalinistas são os reacionários da história. A paródia grotesca e genocida de uma revolução. O estalinismo cirandeiro é a paródia de uma paródia.   

                         



 

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