sábado, 1 de dezembro de 2007

"Sobre a crença em profetizações" ou "Da quiromancia, adivinhações e coisas afins"



Estudar a condição em que se encontra alguém que apelou às forças obscuras é um dos caminhos mais certos e rápidos para o conhecimento e para a crítica desses mesmos poderes. Pois cada prodígio tem seus dois lados, um para quem o faz, outro para quem o recebe. E não raramente o segundo lado é mais informativo que o primeiro, pois já contém em si o segredo deste. Se alguém pede que lhe esbocem a imagem grafológica ou quiromântica de sua vida, que lhe tracem o horóscopo, então no limitaremos por esta vez a perguntar: O que está sucedendo com ele? Poder-se-ia pensar que, antes de tudo, se trata de uma comparação e de um exame. Com maior ou menor ceticismo, examinará asserção após asserção. Na verdade, não é nada disso. Antes, o contrário. Em primeiro lugar, é uma curiosidade tão ardente com o resultado como se aí devesse esperar informação sobre alguém que lhe é muito importante mas totalmente desconhecido. O combustível desse fogo é a vaidade. Logo se torna um mar de chamas, pois agora ele se deparou com seu nome. Mas, se a exposição do nome já for em si uma das mais fortes influências que se pode pensar para seu portador (os americanos empregaram isso de modo prático, ao deixar que seus anúncios luminosos falassem a Smith e Brown), na adivinhação ela se liga obviamente ao conteúdo do que foi dito. Mas, com isso, a situação é a seguinte: a assim chamada imagem interior do próprio ser que trazemos em nós é, de minuto a minuto, pura improvisação. Ela se orienta, se assim podemos dizer, inteiramente de acordo com as máscaras que lhe são exibidas. O mundo é um arsenal de tais máscaras. Só o homem atrofiado ou desolado o busca como simulação em seu próprio interior. Pois nós mesmos somos em geral pobres de imagens. Por isso nada nos faz tão felizes como alguém que se aproxima de nós com uma caixa de máscaras exóticas e então nos apresenta os exemplares mais raros, a máscara do assassino, do magnata das finanças, do circunavegador. Olhar através delas nos encanta. Vemos as constelações, os instantes, nos quais fomos verdadeiramente um ou outro, ou todos de uma vez. Todos nós almejamos este jogo de máscaras como êxtase, e disso vivem até hoje os cartomantes, os quiromantes, os astrólogos. Sabem nos remontar para uma daquelas pausas silenciosas do destino que, só mais tarde, se observa que continham o gérmen do traçado de destino totalmente diferente daquele que nos foi concedido. Que o destino pare assim como um coração – isso percebemos com medo profundo e bem-aventurado, naquelas aparentemente tão mesquinhas, aparentemente tão errôneas imagens características de nós mesmos que o charlatão nos contrapõe. E tanto mais nos apressamos em lhe dar razão quanto mais sedentas sentimos subir em nós as sombras de vidas nunca vividas.

Walter Benjamin. Imagens do Pensamento. Obras escolhidas II (trad. José Carlos M. Barbosa)

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