Nos rincões turbulentos da memória,
o vento que leva os últimos gestos de uma folha.
Espaços vazios, guilhotinados que dançam a vida sem tristeza,
doces sorrisos colorindo o mar do grande Nada,
nosso habitante desde a eternidade.
A folha ainda pode estar em branco,
o vento ainda não ter soprado,
mas a memória ainda geme, sôfrega.
Balbucio palavras em seu nome, ó grande Nada,
e nenhuma flor lança suas tintas sobre a folha.
Suas imagens passeiam tal qual nubentes
em carruagens reais, ansiosos pelo encontro de suas ausências.
São elas os últimos gestos de uma folha?
Nenhum som, nenhuma voz,
apenas a eternidade vazia, me colocando à sua espera.
Chamo os guilhotinados no alvoroço da grande festa.
Na memória ruidosa, não me ouvem.
Apanho a folha ainda em branco e nela desenho o vento,
tentando aplacar as ânsias de uma noite insone.
À sua espera, destronei com minhas mãos trêmulas a escuridão.
Pizarnik me deu fragmentos para dominar o silêncio,
mas não canso de silenciar minhas palavras.
A vida faz troça da memória e vejo, ainda na noite, que você
vem à festa dos guilhotinados, à frágil felicidade
que talvez reste como único gesto desta folha.
Imagem: Chris Steele-Perkins. Da série "England, my England"
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