quinta-feira, 21 de agosto de 2014

Onde alguém reconhece a própria força



Em suas derrotas. Onde fracassamos devido à nossa fraqueza, aí nos desdenhamos e nos envergonhamos dela. Mas onde somos fortes, aí desdenhamos nossas derrotas, aí nos envergonhamos de nossa má sorte. Reconhecemos nossa força através da vitória e da sorte?! Quem, pois, não sabe que nada nos revela tanto como elas mesmas nossas ais profundas fraquezas? Quem, depois de um triunfo no combate ou no amor, já não sentiu passar sobre si a pergunta, como um calafrio voluptuoso da fraqueza: Acontece comigo? A mim, o mais fraco? - Acontece de modo distinto com as sequências de derrotas, nas quais aprendemos todas as manhãs do soerguer-se e nos banhamos em vergonha como em sangue de dragão. Seja a glória, o álcool, o dinheiro, o amor - onde alguém tem sua força, não conhece nenhuma honra, nenhum medo do ridículo e nenhuma postura. Nenhum judeu usurário pode se conduzir com seu cliente de modo mais impertinente do que Casanova com a Charpillon. Tais homens moram dentro de sua força. Um morar especial e terrível, sem dúvida; esse é o preço de toda força. Existência num tanque. Se moramos nele, somos tolos e inacessíveis, caímos em todos os fossos, derrubamos todos os obstáculos, revolvemos sujeita e profanamos a Terra. Mas só onde estamos assim imundos, aí somos invencíveis. 

Walter Benjamin. Imagens do Pensamento. In.: Rua de Mão Única. Obras Escolhidas II. São Paulo: Brasiliense, 2000. Trad.: Rubens Rodrigues Torres Filho; José Carlos Martins Barbosa. pp. 210-211.

Imagem: Saul Steinberg.

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