terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Moi et personne


A tristeza hedionda do vazio,
do buraco onde não há nada,
não sopra o nada,
não há nada,
é em torno ao buraco,
no ponto em que as palavras se retiram,
um buraco sem palavras,
sílaba sem som.

Entre o corpo e o corpo não há nada,
nada além de mim.
Isso não é um estado,
um objeto,
um espírito,
um fato,
ainda menos o vazio de um ser,
absolutamente nada de um espírito, nem do espírito,
não um corpo,
é o intransplantável eu.
Mas não um eu,
eu não o tenho.
Eu não tenho eu, mas há somente eu e ninguém,
não há encontro possível com o outro,
o que eu sou é sem diferenciação nem oposição possível,
é a intrusão absoluta de meu corpo, em toda parte.

Antonin Artaud. Oeuvres. Paris: Gallimard, 2004. pp. 1383-1384. (tradução: Vinícius Nicastro Honesko)