Em Mestre Eckhart o homem pobre é aquele que "não quer nada, não sabe nada e não tem nada."
Despossuído até o fim, privado de tudo, silenciosamente estrangeiro para seu mundo, ignorante de si mesmo como daquilo que o rodeia, o Bloom realiza, no coração do processo histórico e em toda sua plenitude, a amplitude especificamente metafísica do conceito de pobreza.
Ele certamente tinha sofrido toda a espessa vulgaridade de uma época à qual a economia colocou-se no lugar de metafísica para fazer da pobreza uma noção econômica (agora que essa época atinge seu fim, torna-se novamente evidente que o contrário da pobreza não é a riqueza mas a miséria e que, das três, somente a pobreza tem o sentido de uma perfeição. A pobreza designa o estado daquele que pode usar tudo não tendo nada como próprio e a miséria o estado daquele que não pode usar nada, seja porque tenha em excesso, seja porque o tempo lhe falte, seja porque seja sem comunidade).
Desse modo, tudo o que a ideia de riqueza pôde lograr, através da história, de quietude burguesa, de plenitude doméstica, de familiar imanência com o plano sensível, é algo que o Bloom pode apreciar, pela nostalgia ou pela simulação, mas não viver. Com ele, a felicidade tornou-se uma ideia muito antiga, e não somente na Europa. Ao mesmo tempo que todo interesse, e todo ethos, é a possibilidade de um valor de uso que se perdeu. O Bloom compreende somente a língua sobrenatural do valor de troca.
Ele dirige ao mundo olhos que deste nada querem, somente o nada do valor. Seus próprio desejos direcionam-se apenas para ausências, abstrações, cujo meio não é nada mais do que o cu da moça. Mesmo quando o Bloom aparentemente quer, ele não cessa de não querer, pois ele quer até o vazio, ele quer o vazio.
É por isso que a riqueza tornou-se, no mundo da mercadoria autoritária, uma coisa grotesca e incompreensível, uma forma saturada da miséria.
A riqueza não é nada além do que aquilo que vos possui, do que aquilo por meio do qual o SE vos mantém.
Tiqqun. Théorie du Bloom. Paris: La Fabrique, 2000. pp. 88-92. (Trad.: Vinícius Nicastro Honesko).
Imagem: Georges de La Tour. O neonato. 1640-50. Musée des Beaux-Arts, Rennes.
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