O hipster é a síntese da ideologia do capitalismo contemporâneo. É o capitalismo com má consciência, o esquerdismo tornado consumo de massa, moda. Junção de hippie com yuppie, o hipster é a figura que faz uso de indumentárias e performances pretensamente negadoras do mainstream simplesmente por estilo ou autopromoção. São mercadorias ambulantes, a "geração comercial" (Deresiewicz). O hipster médio adota um discurso esquerdista de almanaque, são conhecidos por seu desleixo cultivado nos mínimos detalhes, barbas, vestidos e calçados descolados, adereços retrôs, culto pelo underground ou pelo esotérico na música e na literatura (o hipster supõe estar para muito além do gosto da massa). Com o ar blasé dos solitários ou nos agrupamentos com risinhos ameliepoulainicos e papos repletos de boutades pseudo-filosóficas, nos caros bares sujos temáticos da moda ou nas redes sociais, o hipster é a máscara fajuta de um inconformista, a fachada enragé de alguém que apenas quer ser "popular". Estas figuras, quando são alimentadas pelos pais (esquerdistas frustrados, como professores de universidade aposentados, ou mesmo militares da reserva, até diretistas, malufistas, adeptos da TFP ou da Opus Dei) são metidos a artistas, a "intelectuais" (com óculos retrô), a cineastas sem filmografia. Ou, sem mesada, são publicitários, aplicadores da bolsa, empresários do ramo informático, "gestores culturais", empreendedores no mercado de orgânicos, managers! Um hipster convive muito bem com o mercado, com o dinheiro, com homework's, network's (etc.) e com sua privacidade burguesa e asséptica (com quadros de Sebastião Salgado e gravuras de um marginal da moda). Este é o melhor dos mundos possíveis! Os hipsters de São Paulo não vão além das marginais, habitam a parte boêmia da zona oeste, e a vila madalena tem muitos turistas para o hipster paulistano de carteirinha! Os aspirantes a hipster curitibocas, - a provinciana Londres brasileira é a capital brasileira do hipsterianismo -, não saberiam citar nem um único nome das 122 favelas "asquerosas" da cidade. "Sou esquerdista, mas não toque na minha mesada ou na minha herança!" O capitalismo de nosso tempo se tornou obsceno, é difícil para um jovem se dizer um conservador, com a cara lavada, sem se tornar impopular no grande mercado onde passa sua vida. O hipster é o direitista com barbas e trajes de guerrilheiro - ou a moça riponga frequentadora de rodas de samba de raiz - por crise de consciência. É a despolitização mais alienante travestida em performatismo pseudo-politizado. Portando eco-bags ou fumando marijuanas orgânicas. É a face jovem e mercantil do novo cinismo.
Imagem: Matthew-Diffee
10 comentários:
Simplesmente fantástico! Em BH tem inúmeros exemplares pelos cafés da Savassi.
Descrição mais precisa, impossível!
Parabéns!
achei pesado e com mto rancor.
pesado é viver em um parque temático; ira é algo muito distinto de rancor.
Blogueiros que criticam o capitalismo também são Hipster! Eles fingem não saber que o computador que ele usou para escrever o texto "cabeça" do seu blog veio do mais puro sistema capitalista de produção!
nesta lógica, comentadores anônimos também.
ps. não sei manejar manejar um arco-e-flecha, infelizmente.
Adorei seu blog. Achei por acaso na net. Tô me deliciando. Abç.
Excelente definição! Estava demorando alguma crítica tão sagaz.
Já experimentei uns minutos de prosa com uns tipos assim, na Savassi mesmo, em BH; é errado generalizar, mas esse pessoal ai que adora macaquear jargões filosóficos sociologicos, e qualquer outra área 'cult', falam e entendem tudo de maneira coisificada. No fim das contas hipsters são uns fetichistas...
Ótimo texto!
Boquiaberta com a precisão do texto e com a sagacidade da resposta a um comentário.
p.s.: infelizmente também não sei manejar um arco-e-flecha.
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