segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

Anno Domini Nostri Iesu Christi e seus lacaios


Os lacaios de um deus sem rosto - mentecaptos trajados de branco - começam o ritual do servilismo. Operam rigorosamente dentro das distâncias que os separam de seu deus, mimetizando de modo infantil (no pior sentido) os sacrifícios sanguinolentos de outrora de forma banal: o mal impregna este mundo de seres que já não são capazes da faculdade de julgar, sobre a qual falava o velho onanista de Königsberg. Cantam a roda de Chronos deleitando-se com os objetos fantasmagóricos que há pouco seu sanguinário deus lhes havia dado (objetos que prometem uma completude que, porém, mostram apenas suas faltas - suas tão detestadas e esperadas culpas). A ânsia pelo ciclo, pelo cíclico, é o mal estar transformado em mercadoria. Jogam pólvora aos ares, lamentam perdas que nunca foram ganhos, clamam pelos próximos cretinos índices de "expectativa de vida" (expressão das que me causam mais nojo), deixando a vida à promessa e à venda. Incapazes de imaginar, são também incapazes tomar decisões. Repetem um ciclo mítico de esperança e que, entretanto, carrega o mundo à catástrofe. Como rolos de feno num deserto, vão ao sabor desses ventos míticos até que hoje, na comemoração fantástica, empesteiam o primeiro balneário que lhes aparece pela frente. E viva o Anno Domini Nostri Iesu Christi!!!

Imagem: Rogier van der Weyden. Tríptico Bladelin (asa esquerda). 1445-50. Staatliche Museen, Berlin. 

sábado, 29 de dezembro de 2012

Pequeno delírio em parágrafo V


Se a serpente destila veneno por suas presas, o escritor o faz por meio de seus dedos no teclado. A vontade inóspita de desfazer-se dos sentimentos em letras, em sons suscitados no ato da escrita, na voz que lhe falta a todo instante - que, no entanto, a serpente possui desde seus primeiros movimentos. Desfaçatez é a escrita - é o delírio do animal de voz articulada. É com ódio que rompo meu silêncio e tento lançar essas vexatórias palavras ao tempo, ao relento. Descobertas, palavras perdidas, é a vida que crepita junto com o som seco dos dedos no teclado. É o veneno que, aos poucos, conduz à morte. 

Imagem: Paul Gauguin. Autorretrato. 1889. National Gallery of Art, Washington.

quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Glosa delirante aos delírios


A vida é a arte da tauromaquia. Envolve o risco, a trapaça, o gesto, o bailado contra uma natureza estúpida e bela.
Mas não é a tauromaquia cantada por Goya e Leiris, o épico tauromático, o espetáculo viril e trágico.
Esta vida é sórdida como a corrida de touros magros no pequeno coliseu mexicano, onde a mística do toureiro sub-proletário não ultrapassa o escapulário e o mezcal.
Afinal, nada ultrapassa a sordidez, Blanchot morreu em uma solidão teatral e sórdida: Des Esseintes em uma quinta pequeno burguesa de Île-de-France. Sonhando em ser um dos moleques mexicanos de Buñuel.
Todo épico e toda tragédia são parodicamente farsescos. A metafísica não explica os gritos desesperados do mundo.
O desespero é sempre mundano, sem edulcorações.
A vida bebe em botecos baratos, onde os espelhos de Narciso foram quebrados a pauladas. Os cacos estão cobertos pela poeira misturada ao suor.
A vida é a memória da mulher assassinada na periferia de Ciudad Juárez, como nos livros daquele chileno intempestivo.

Imagem: Fotograma de "Los olvidados", de Buñuel. 

Pequeno delírio em parágrafo IV


"A comunidade não é o simples colocar em comum, nos limites que ela se traçaria, uma vontade partilhada de ser em muitos, seja para nada fazer, isto é, fazer nada mais do que manter a partilha de 'algo' que precisamente parece ser já sempre subtraído à possibilidade de ser considerado como uma parte para uma partilha: palavra, silêncio." Maurice Blanchot

Corneando as plásticas noites de domingo, o touro aquático - que, outrora, poderia ter sido o enviado de Poseidon a Minos - desfaz-se do rebanho para saborear o ardor da conquista. No mesmo outrora, assola uma ilha e, talvez, é a peça chave dos embustes de um sequestro. Porém, nas noites em que o presencio, desfere seus golpes em silêncio. É um chiste, a própria imagem dos homens solitários que golpeiam seus corpos, numa espécie de ritual masoquista infinito, em busca da parte que lhes falta. Tolos homens, tolo touro, não sabem que a parte sempre lhes falta, não importa quão hábeis sejam na arte dos golpes. Em seus quase loquazes movimentos, os cornos do touro fazem faísca ao raspar o chão e resplancescem o céu da noite dominical, tal qual seus reflexos, os perdidos e silenciosos homens, faziam ao sair das cavernas atemporais ao frio e descoberto céu das eras glaciais. Sombras e luzes são os espasmos dos corpos em silêncio; metáforas vazias (e qual não o é?) do périplo dos homens na busca por seu "algo". O touro e o silêncio tentam rebater firmes meus delírios - e qual a tolice de se contar os delírios? São sempre incontáveis. Há somente um espectro: o in-comunicável - que, aqui, em meio ao vazio dissimulado da moça que uma vez fora raptada, faz-se ainda audível. A partilha é desde sempre interdita e a palavra, ou o silêncio, soltam-se em riso incontrolável diante da patética e, por isso, deliciosa existência... 

Imagem: Rembrandt. O rapto de Europa (detalhe). 1632. J. Paul Getty Museum, Los Angeles.     

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Pequeno delírio em parágrafo III


A realidade é inegável. Não por um seu suposto caráter evidente, pois não há dar-se a ver. Não por uma impossibilidade de dela escapar, pois o que são as palavras senão adendos fugidios à realidade? Não, a realidade não é uma conta das idades do Real - isso que não cessa de não se escrever -, mas tão-somente uma das pontas de um dos icebergs da possibilidade. Supor um inexorável, supor um tempo composto de coisas, supor, su-pôr, é sobrepor realidades: eis as falácias da inegabilidade da realidade. Mas nada diz o caráter inegável da realidade. Não por sua proximidade com a morte (que só sabemos por sermos compostos pelas potencialidades falsas chamadas palavras), não por sua aparente intransigência em relação às consciências (aparência e consciência, mais uma vez, apenas nosso toque Real na realidade). Não. A realidade é inegável porque não se nega o que nunca se afirma.

Imagem: Nicola Scafidi. Luchino Visconti durante as filmagens de "Gattopardo". Palermo. 1962.

segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Pequeno delírio em parágrafo II


As palavras me vêm como pedregulhos atirados por esses insolentes moleques da vizinhança. Armo-me com uma tesoura para cortá-las, melhor, para dissecá-las e colocá-las à luz. Insuspeitado, como o velho Murilo, vejo-as como elementos que se assanham e querem me ajudar a organização do meu lúcido delírio. Moleques travessos! Não tenho mais forças e sucumbo com a primeira pedrada em minha cabeça. Tento, mais uma vez, apanhar os resquícios de sentido que elas poderiam me trazer. Petardo! E nada mais. Dominam-me impressões avassaladoras do inconveniente de ter nascido (mas que bom inconveniente...). Batalho em vão. São as imagens das Highlands que minam o Canal Grande de Venezia e, como as pedras, derrubam-me. Se um livro é um suicídio diferido, Cioran, sua matéria, as palavras, é a morte a conta gotas.

Imagem: Nicola Scafidi. Emigrante. Palermo, 1960.

Glosa marginal ao Soneto de Fidelidade


e se a vida não fosse mais que esta sequência de estórias indefinidas, imponderáveis, incompletas
um grande labirinto sem centro e sem buracos para se esconder
e se meus dias não se passassem neste úmido equador metafísico
entre a indecência e o desespero
talvez eu pudesse cuidar de você

as portas-estandartes das femmes authentiques me chamariam de canalha, ora esta,
cuidar de uma mulher autônoma
mas cuidar não é carregar a bolsa
(tenho vontade de dar voz de assalto ao modernóide com a bolsa da companheira à tiracolo)
nem respeitá-la como a putinha sacra da princesa da Inglaterra
é tratá-la como mulher, ponto.  

todos nós inautênticos metafísicos canalhas poetas desesperados
leitores do Bolaño e de outros cachaceiros
precisamos é de um colo

quer ser sugada para o buraco negro de uma vida bretoniana?
às travessuras e travessias de um huckleberry finn crescido
que ainda sonha em se alistar em alguma guerrilha de quinta
por mera aventura?

aceitaria minha intolerância à presunção literária bundona que nos ronda
ao ponto de dizer que o tal de galera, que você gosta, é um cretino sem precisar ler nada do sujeito?
aceitaria meus pesadelos e, por vezes, meu mutismo? 

aceitaria minhas derivas etílicas ao lado de um insurgente Marechal
conduzindo as moças do centro velho?
aceitaria que a vida finda e que nenhum jardim ou cercania poderá ser planejado
se sonho com selvas e desertos?
aceitaria um amor tuaregue
sem videoprogramas dominicais
mas com uma rede e a ideia repentina de morar um tempo no Tocantins?

e, se for responder sim a estas provocações,
que isto não fosse feito na frente de um padre, pároco, pastor, professor, cartorário
ou outro filho da puta deste mundo das merdas administradas?

Imagem. Edward W. Kemble, Ilustração da edição de "The Adventures of Huckleberry Finn", 1885.

domingo, 23 de dezembro de 2012

Pequeno delírio em parágrafo


 a Paulo Leminski
"a poesia é a realidade.
o campo da poesia são os homens.
se fossem as palavras, estaríamos feitos." - Oscar Conde.

Às voltas com uma espécie de realismo visceral, toco palavras como toco a carne. Espúria ilusão dos jogos de braços e abraços, caro Leminski. Não há toque no campo da poesia, a encarnação é o feitiço do per-fazer-se. Estaríamos feitos, mesmo se o abismo das palavras nos engolisse; estaríamos feitos, mesmo se as palavras fossem o sopro que falta nos momentos em que a realidade - o doce insulto da palavra à vida - esboça seus desenhos opacos na carne dos homens: um passo sem solução. O mistério da vida profana é o indulto que as palavras se permitem nos dar - a nós, pobres e tolos palavrórios soltos em carne pelos abismos e pelos campos floridos de um verão quase invernal.

Imagem: Hieronymus Bosch. Jardim das delícias terrestres (detalhe). 1500. Museo del Prado, Madrid.

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Imagens de Antanas Sutkus




O despertar é o lapso do sonho da vida. O vagar das imagens em negativo, de Antanas Sutkus - são mais de um milhão de negativos que o fotógrafo mantém em seu acervo e que aos poucos vem revelando -, expande sonho em meio ao turbilhão do despertar traumático da experiência soviética. As fotografias que se revelam, anos após terem sido tiradas, são os impossíveis de outrora que, inesquecíveis no olhar fotográfico de Sutkus, surgem como puncta que tocam os olhares que a eles se dirigem. As máquinas de refrigerante, os rostos em meio a caminhos repletos das folhas outonais, as mulheres e crianças de olhares tristes. É o sonho vívido da vida que, após o vagar inadvertido pelas décadas da oficialidade das poses e retratos, torna-se, por ínfimos instantes (o do olhar de quem se depara com tais imagens), um lapso de memória e, portanto, para lembrar Picabia, a forma da vida. Dos sonhos imaginados em que estamos imersos surgem imagens do despertar. A moça que lança seu olhar à rua, debruçando-se como uma gárgula desde o alto de um edifício, rompe a imobilidade eterna das feias figuras das igrejas e, como um despertar, exibe a beleza em movimento da memória. Sartre caminha no deserto - o apogeu do existencialismo: e como não lembrar da praia em que Camus coloca seu estrangeiro parado, olhando para o mar e para o sol? - acompanhado apenas pela sombra de Beauvoir (e talvez seja uma das melhores imagens de Sartre). As duas crianças que de dentro de uma espécie de tambor (o mesmo que se transforma em embarcação para um menino em outra imagem)  deixam seus sorrisos sonoros ecoarem pelos tempos em que permaneceram negativas. O gesto da criança que se afaga e se apega na então gigantesca mão de um adulto, como que a lembrar que qualquer mitologia de segurança é estraçalhada pelo mais singelo gesto infantil. As fotografias de Sutkus são apenas imagens que irrompem a crosta de uma historiografia oficial e lançam uma sombra de seus presentes revelados em seus passados negativos. Como pontiagudas lâminas, cortam o sonho e apenas remontam uma possível história da vida.































Imagens: Antanas Sutkus. Maratona na rua da Universidade, em Vilnius, 1959; Uma mão de mãe, 1966; Jean-Paul Sartre na Lituânia, 1969; Festival de música, 1970.

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Sonhos e abismos


"O abismo entre nós e deus está cheio do escuro de deus e, quando alguém o prova, deve calar-se e gritar em tal abismo (é mais necessário isso do que o atravessar)." Rilke e seu deus absconditus passeam de mãos dadas. Nebulosa noite em que a luz do sonho não se apaga - e há luz onde a noite escura insiste em fazer calar? Panteras correm e não me deixam ver senão seus olhos: assustadores, mas ao mesmo tempo perplexos; inquisidores, mas com uma pitada de comoção. Relaxo a cabeça nestes travesseiros desgastados por cabeças que jamais conhecerei. Vejo o abismo como talvez nunca antes. Silêncio, palavras: o palavrório mordaz desses seres que jazem - vivem mortos - nos seus trajetos abismais e quotidianos. Onde está o escuro de deus?! Corremos o risco de atravessá-lo sem nem mesmo perceber aqueles ferozes olhos da pantera. Sou eu quem grito! É o espanto da existência. Despertar...

Imagem: Hieronymus Bosch. Inferno: a queda dos condenados. 1500-1504. Palazzo Ducale, Venezia.

quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Revolta contra a poesia


Nós sempre escrevemos a partir da encarnação da alma, mas ela já tinha acontecido, e não por nós, quando nós entramos na poesia.
O poeta que escreve se dirige ao Verbo e o Verbo tem suas leis. Está no inconsciente do poeta crer automaticamente nessas leis. Ele se crê livre mas ele não o é.

Há algo atrás de sua cabeça, ao redor das orelhas de seu pensamento. Algo está em germe na sua nuca, onde já estava quando ele começou. Ele é o filho de suas obras, talvez, mas suas obras não são dele, pois o que era dele na sua poesia não foi ele que nela tinha colocado, mas esse inconsciente produtor da vida que o tinha designado para ser seu poeta e que ele não tinha designado. E que nunca estava à sua disposição.

Eu não quero ser o poeta de meu poeta, desse eu que quis me escolher poeta, mas o poeta criador, em rebelião contra o eu e o si-mesmo. E me lembro da rebelião antiga contra as formas que vinham até mim.

É pela revolta contra o eu e o si-mesmo que me livrei de todas as más encarnações do Verbo que sempre foram, para o homem, um compromisso de covardia e de ilusão, de não sei qual fornicação abjeta entre a covardia e a ilusão. Eu não quero um verbo vindo de não sei qual libido astral e que foi completamente consciente nas formações de meu desejo em mim.

Há nas formas do Verbo humano não sei qual operação de voracidade, a auto-devoração de rapina em que o poeta, limitando-se ao objeto, vê-se comido por esse objeto.
Um crime pesa sobre o Verbo feito carne e o crime é o de ter admitido isso. A libido é um pensamento de animal e são todos esses animais que, um dia, metamorfosearam-se em homens.

O verbo produzido pelos homens é a ideia de um pervertido enterrado pelos reflexos animais das coisas e que, pelo martírio do tempo e das coisas, esqueceu que o tínhamos inventado.
O pervertido é aquele que come seu si-mesmo e quer que seu si-mesmo o nutra, procura no seu si-mesmo sua mãe e quer possui-la. O crime primitivo do incesto é o inimigo da poesia e o assassino de sua imaculada poesia.

Eu não quero comer meu poema, mas quero doar meu coração a meu poema e o que é meu coração ao meu poema. Meu coração é o que não é meu. Dar seu si-mesmo a seu poema é arriscar também ser violado por ele. E se eu sou Virgem para meu poema, ele deve permanecer virgem para mim.

Eu sou esse poeta esquecido, que se viu cair na matéria um dia e a matéria não me comerá. 
Eu não quero esses reflexos envelhecidos, consequência de um antigo incesto vindo de uma ignorância animal da lei Virgem da vida. O eu e o si-mesmo são esses estados catastróficos do ser em que o Vivente se deixa aprisionar pelas formas que percebe de si. Amar seu eu é amar um morto e a lei do Virgem é o infinito. O produtor inconsciente de nós-mesmos é aquele de um antigo copulador que se entregou às mais baixas magias e que retirou uma magia da infâmia que há em se reduzir si-mesmo a si-mesmo sem fim até fazer sair um verbo do cadáver. A libido é a definição desse desejo de cadáver e o homem em queda é um criminoso pervertido.

Eu sou esse primitivo descontente com o horror inexpiável das coisas. Eu não quero me reproduzir nas coisas, mas quero que as coisas se produzam por mim. Eu não quero uma ideia do eu no meu poema e nele não quero me rever.

Meu coração é essa Rosa eterna vinda da força mágica da Cruz inicial. Aquele que se crucificou Nele-Mesmo e por Ele-Mesmo jamais voltou a si-mesmo. Jamais, pois esse si-mesmo pelo qual sacrificou Ele-Mesmo, também a este ele deu à Vida após o ter forçado em si-mesmo a tornar-se o ser de sua própria vida.

Eu quero ser para sempre este poeta que se sacrificou na Cabala do si para a concepção imaculada das coisas.    

Antonin Artaud. Révolte contre la poésie. In.: Oeuvres. Paris: Gallimard, 2004. pp. 937-938. (trad.: Vinícius Nicastro Honesko)

Imagem: Antoni Artaud. Autorretrato. 1947

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Pequeno Parágrafo sobre o Azul


A máquina do mundo roda sobre minha cabeça. O som é azul, os sentidos faltam e a máquina continua seu giro inexorável. "Há manchas azul-claras no meio do esplendor do amarelo. Só meus olhos viram as manchas azul-claras. Fizeram bem aos meus olhos. Por que ninguém mais viu as manchas azul-claras no meio do esplendor do amarelo?" dizia Kandisky, talvez se sentindo mal com o peso da máquina sobre sua cabeça. Não há roteiros para o azul. Ainda ouço o som do canto dos pássaros do paraíso: ecoam azul em meio ao amarelo. Olho com mais olhos e nem mesmo o claro do azul ainda traz sentido. Falta. E talvez sejam olhos outros que deveriam olhar através dos meus pontiagudos olhos-armados. Trevas azuis. Lance de um dia. No mar profundo, a dor da existência. O azul eterno, irônico e opressor. Seu som incontrolável agonia. Azul é a cor da máquina do mundo.

Imagem: Kandinsky. Blue Crest. 1917.