sexta-feira, 6 de março de 2015

Estudo sobre o olhar



Percorro as ruas vazias
sem cores e vertidas em palavras
os horizontes preenchem cada esquina
são os traços de uma voz que se foi
desde os dias em que as vistas
ainda eram sonhadas

Cada passo é uma volta ao mundo
estranhas vozes em línguas desconhecidas
no mais íntimo espaço das vias
respiratórias, urbanas, romanas

Piso um campo de flores
saio com perfumes verdes
soltos pelos olhos da moça
que há pouco eu beijava

O sonho do caminho perfeito
a retidão, o cristo morto,
os burocratas que se deleitam
com sua baba

Volto ao caminho, deito nas flores
e espero a moça
ela que nunca esteve aqui
e o deus da noite vazia
zomba da felicidade e dança
com minha sombra arredia

A esquina está distante
como o mundo, como o mundo
silêncios em cada horizonte
sístole, diástole, sístole diástole
e os burocratas quase se afogam
de tanto gozar com suas babas


Imagem: Gerd Ludwig. Pripyat, Ucrânia.

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