Há uma vela acesa tentando me dizer a luz. Aliás, desde há muito a luz inquieta daquela vela dança em meio às sombras que produz, dança tal qual as velas das naves que outrora cruzavam mares sem mapas, obrigando o non plus ultra a não dizer mais nada. O balanço da luz é como o talento de algumas palavras para se moverem no caos, diria um poeta de que tanto gosto. Mas à vela resta a tarefa de tremular sobre o mar ainda sombreado, permanece seu papel de iluminadora de epitáfios ou, por vezes, a impossibilidade de dizer a parca luz que por instantes emite. Acender o texto de nada adianta, Maria. Essa vela grega também quer me dizer que a luz não é nada diante da sombra que a deglute incessantemente, dia após dia. E fica uma pergunta: posso morrer gregamente? Há amores pelo caminho, mas eles permanecem o tempo da vela acesa, Herberto, e, para eles, nenhum necrológio poderia ser escrito. Com eles, esses amores idos, entretenho-me como com a vela que tenta me dizer a luz, como com as sombras que apagam as velas no horizonte do mar sem mapa, como com as cartas que escrevo para todos e para ninguém.
Imagem: Caravaggio. Narciso. 1598-99. Galleria Nazionale d'Arte Antica, Roma
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