Toninho Vaz me contou que você morreu um tanto esquecido, meu velho. Abandonado por uma poetisa na fria Curitiba, sua verdadeira lenda se mantém apenas na memória dos velhos beberrões que ainda perambulam pelos bares sujos próximos da rodoferroviária. Não sei se há algum vivo, nem estes botecos, que antes eram muito mais sujos. Nem seu compadre Ivo está aí para afiançar estas histórias. Tudo isso antes de você mudar para Tibagi, onde terminou seus dias, talvez mirando os campos gerais. Bandido que sabia latim, você sempre esteve mais próximo de João Antônio que de Jaime Lerner.
Em um tempo em que o fracasso está fora de moda, sua imagem foi estilizada: seus óculos, seu bigode e roupas maneiras fazem a cabeça da moçada. O haikai sem o corte do samurai. A aura da transgressão sem a revolução da forma. O provincianismo, que você sempre demoliu, hoje é autossuficiente e presunçoso. É um tempo estranho de pastiches e bundões devidamente empacotados. Lucram com seu nome, ele está publicado em uma editora de peso, muito distante das edições artesanais que encalharam em seu sótão de madeira. Suas canções são cantadas em caros saraus e bares da moda, com caras cervejas artesanais da moda. Sem o Blindagem - a propósito, a banda continua, mesmo sem Ivo, em algum auditório mambembe do interior.
Adeus ao poeta da Curitiba oficial, o poeta da pedreira e do hipsterianismo. Que este cadáver seja enterrado.
Restam: a flor no asfalto do terminal Guadalupe, poucas casas de madeira, o último bar aberto na madrugada gelada, um assovio de vento na cruz do pilarzinho e uma vontade de lutar.
Imagem: Ovídio Vieira, 1983.
Imagem: Ovídio Vieira, 1983.
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