domingo, 11 de dezembro de 2016

Pequeno parágrafo sobre a geometria II


Onde desagua o rio Eufrates? Talvez à soleira do primeiro grande poema divino. Naquele tempo, dizia-se que deus havia combinado as palavras e, esquadro em mãos, riscou em seu corpo a passagem dos grandes rios. Fizeram-se, assim, todas as coisas: dos dados lançados por um poeta vindouro ao fogo nas mãos de algum homem das cavernas. E aquele tempo se fez presença do mundo, e o mundo tornou-se o corpo de deus e a vida dos homens, e não havia mais sentido no corpo divino do que nas palavras com as quais procuramos, desde então, o encontro das águas. Seguimos sujos na caça da língua que supomos pôde um dia ser dita enquanto alguém navegava o grande Eufrates. E tudo não passou de um poema lido antes de dormir e de uma voz portuguesa a dizer: "Mas um poema só é toda a vida de um homem e tenho por manobra de diversão revelar a outrem uma coisa não menos íntima do que a mais íntima peça de roupa." 

Imagem: Kasimir Malevich. O homem correndo. 1933. Georges Pompidou, Paris.

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