segunda-feira, 23 de julho de 2012

Desvarios labirínticos


A Giorgio Caproni

"Por que achar o fio do Labirinto? / O importante é viver dentro dele". Era difícil dormir, era difícil não dormir, era difícil desemparelhar a jamais emparelhada trama da vida. Nenhuma surpresa á mais surpreendente do que encontrar velharias. Nada de novo, não há novo. Tudo empenha, tudo desagrega o nada que vejo permear o todo. Néant, niente, nothing... revelações inóspitas da dureza crua da matéria. Nenhuma palavra, nenhum som, nem mesmo o esperado e acalentador sopro divino. Matéria bruta soprada, movimento, desalento. As portas se fecham e com elas o labirinto sem corredores faz-se mais nítido. Nada de movimento, tudo de movimento; terra perdida entre o sono e a vigília, nenhum sonho, todos os sonhos. Matéria, matéria, tudo é matéria mar-téria, artéria, sangue, movimento, artilharia pesada à espera de oponentes... labirinto, labirinto, mas vazio, devastado, sem portas e sem janelas... sonoro, sonoro labirinto da memória. Tudo se foi, tudo se vai, importa não sair, importa viver, im-porta, de-porta, ex-porta... sair sem fios, sem Ariadne, como um touro alheio ao seu próprio sangue a escorrer pelo chão da Plaza. Somem os sonhos, sobem desvarios, sobram imagens. Nada de novo, não há novo. Despedaça-se o que escreveria sem deixar chances de escrita às palavras soltas. Sopro, matéria soprada... descaso, acaso, chance, caso. Nada resta senão a importância desimportante do viver... E saio andando carregando comigo o esgarçado livro da vida a soltar suas páginas rabiscadas pelo chão já batido das estradas pelas quais tantos outros, tantos eus, já passaram... 

Imagem: Tintoretto. Criação dos animais. 1551-52. Galleria dell'Accademia, Venezia.

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