Havia sons e, por trás deles, palavras. Era o crepitar de galhos secos sob meus pés, eram beija-flores, bem-te-vis, sopro de vento invernal nas cerejeiras em flor. Eram sons e, por trás deles, palavras. Havia um mundo descoberto na última manhã de sol neste mundo. Havia um mundo e tudo o que nele havia eram palavras que agora, somente agora, depois do fim do mundo, descubro. Vejo e via que o imperfeito do tempo, que o tempo imperfeito, era o modo como aqueles sons, com todas as palavras que carregavam, armavam para mim o único tempo perfeito. As palavras que agora descubro são o mundo que havia, e nada mais. Havia um mundo feito de sons e as palavras que por trás daqueles sons se escondiam não me faziam sentido, senão como canto de bem-te-vis, como crepitar de galhos secos, como beija-flores com seus ruídos frenéticos. E descubro, junto com as palavras, a perfeição de um mundo cheio desses imperfeitos, pleno da imperfeição dos verbos (e no princípio não era o Verbo?) que agora vejo zanzar não mais como os sons da última manhã de sol naquele mundo, mas como minha única imperfeição possível. Não há e não havia mundo perfeito e tudo não passava de um era uma vez...
Imagem: António Lopez. Membrillero de Ciudad Florida. 1970. Coleção Privada.
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