domingo, 10 de agosto de 2014

A Obra morre




Iñaki Echavarne, bar Giardinetto, rua Granada del Penedés, Barcelona, julho de 1994. Por algum tempo, a Crítica acompanha a Obra, depois a Crítica se desvanece e são os leitores que a acompanham. A viagem pode ser comprida ou curta. Depois os leitores morrem um a um, e a Obra segue sozinha, muito embora outra Crítica e outros Leitores pouco a pouco se ajustem à sua singradura. Depois a Crítica morre outra vez, os Leitores morrem outra vez, e sobre esse rastro de ossos a Obra segue sua viagem rumo à solidão. Aproximar-se dela, navegar em sua esteira é um sinal inequívoco de morte segura, mas outra Crítica e outros Leitores dela se aproximam, incansáveis e implacáveis, e o tempo e a velocidade os devoram. Finalmente a Obra viaja irremediavelmente sozinha na Imensidão. E um dia a Obra morre, como morrem todas as coisas, como se extinguirá o Sol e a Terra, o Sistema Solar e a Galáxia, e a mais recôndita memória dos homens. Tudo que começa como comédia acaba como tragédia.

Roberto Bolaño. Os detetives selvagens. São Paulo: Cia das Letras, 2006. Trad.: Eduardo Brandão. p. 497.

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