Há alguém que me olha desde nenhum lugar. Mas sinto, sinto como nunca o toque de um olhar. E é doce, leve e repentinamente suave. Acho que chego a ver os olhos que desferem tal olhar. Suspeito serem eles arredios e, portanto, finjo não os ver. É só uma suspeição, pois não sei nem ao menos se estou sendo olhado. E as imagens giram com vagar. Já não sei mais se as chaves que outrora abriam as portas dos olhares são as mesmas que me deixam sentir o toque desses olhares. Tolo, inefavelmente tolo! Jamais houve chave! Só o silêncio surdo das imagens e dos toques de olhares que nunca percebi. Deito esperando passar o efeito do tóxico. Olho para a luz até sentir que já não sinto ver. Nada passa senão a percepção da passagem. O tempo, incrustado e ao mesmo tempo (como fugir dele?!) arredio, é intransigente. E sinto o instante do toque do olhar. Único, indelével, porém, inexistente. Cansado, deixo-me guiar por palavras cegas e, exausto, sinto que nada resta senão olhos em sonho que veem e sentem o que só espera por despertar...
Imagem: Agnolo Bronzino. São Mateus. 1525. Cappella Capponi, Santa Feliticà. Firenze.
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